Ministro do STF fala sobre sua possível candidatura à Presidência. Veja!
Para o
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ainda há bolsões de intolerância
racial não declarados no Brasil. Ele afirma não ser candidato e diz que seu
nome tem aparecido com relevância em pesquisas eleitorais por causa de
manifestações espontâneas da população. Segundo ele, que se define
politicamente como alguém de inclinação social democrata à europeia, o Brasil
precisa gastar melhor seus recursos públicos, com inúmeros setores que podem
ser racionalizados ou diminuídos.
O senhor é
candidato à presidente da República?
Não. Sou muito
realista. Nunca pensei em me envolver em política. Não tenho laços com qualquer
partido político. São manifestações espontâneas da população onde quer que eu
vá. Pessoas que pedem para que eu me candidate e isso tem se traduzido em
percentual de alguma relevância em pesquisas.
As pessoas
ficaram com a impressão de que o senhor não cumprimentou a presidente.
Eu não só
cumprimentei como conversei longamente com a presidente. Eu estava o tempo todo
com ela.
O Brasil está
preparado para um presidente da República negro?
Não. Porque acho
que ainda há bolsões de intolerância muito fortes e não declarados no Brasil.
No momento em que um candidato negro se apresente, esses bolsões se insurgirão
de maneira violenta contra esse candidato. Já há sinais disso na mídia. As
investidas da “Folha de S.Paulo” contra mim já são um sinal. A “Folha de
S.Paulo” expôs meu filho, numa entrevista de emprego. No domingo passado, houve
uma violação brutal da minha privacidade. O jornal se achou no direito de expor
a compra de um imóvel modesto nos Estados Unidos. Tirei dinheiro da minha conta
bancária, enviei o dinheiro por meios legais, previstos na legislação, declarei
a compra no Imposto de Renda. Não vejo a mesma exposição da vida privada de
pessoas altamente suspeitas da prática de crime.
Como pessoa
pública, o senhor não está exposto a todo tipo de pergunta e dúvida dos
jornalistas?
Há milhares de
pessoas públicas no Brasil. No entanto os jornais não saem por aí expondo a vida
privada dessas pessoas públicas. Pegue os últimos dez presidentes do Supremo
Tribunal Federal e compare. É um erro achar que um jornal pode tudo. Os jornais
e jornalistas têm limites. São esses limites que vêm sendo ultrapassados por
força desse temor de que eu eventualmente me torne candidato.
Que partido
representa mais o seu pensamento?
Eu sou um homem
seguramente de inclinação social democrata à europeia.
Como ampliar o
Estado para garantir direitos de quem esteve marginalizado, mas, ao mesmo tempo,
controlar o controle do gasto público para manter a inflação baixa?
O primeiro passo
é gastar bem. Saber gastar bem. O Brasil gasta muito mal. Quem conhece a
máquina pública brasileira, sabe que há inúmeros setores que podem ser
racionalizados, podem ser diminuídos.
O senhor disse
que o Brasil está numa crise de representação política. O que quis dizer com
isso?
Ela se traduz
nessa insatisfação generalizada que nós assistimos nesses dois meses. Falta
honestidade em pessoas com responsabilidade de vir a público e dizer que as
coisas não estão funcionando.
Quando serão
analisados os recursos dos réus do mensalão?
Dia primeiro de
agosto eu vou anunciar a data precisa.
Eles serão
presos?
Estou impedido
de falar. Nos últimos meses, venho sendo objeto de ataques também por parte de
uma mídia subterrânea, inclusive blogs anônimos. Só faço um alerta: a
Constituição brasileira proíbe o anonimato, eu teria meios de, no momento
devido, através do Judiciário, identificar quem são essas pessoas e quem as
financia. Eu me permito o direito de aguardar o momento oportuno para
desmascarar esses bandidos.
Por que o senhor
tem uma relação tensa com a imprensa? O senhor chegou a falar para um
jornalista que ele estava chafurdando no lixo.
É um personagem
menor, não vale a pena, mas quando disse isso eu tinha em mente várias coisas
que acho inaceitáveis. Por que eu vou levar a sério o trabalho de um jornalista
que se encontra num conflito de interesses lá no Tribunal. Todos nós somos
titulares de direitos, nenhum é de direitos absolutos, inclusive os
jornalistas. Afora isso tenho relações fraternas, inúmeras com jornalistas.
A primeira vez
que conversamos foi sobre ações afirmativas. Nem havia ainda as cotas. Hoje, o
que se tem é que as cotas foram aprovadas por unanimidade pelo Supremo. O
Brasil avançou?
Avançou.
Inclusive, entre as inúmeras decisões progressistas que o Supremo tomou essa
foi a que mais me surpreendeu. Eu jamais imaginei que tivéssemos uma decisão
unânime.
Nos votos, vários
ministros reconheceram a existência do racismo.
O que foi dito
naquela sessão foi um momento único na história do Brasil. Ali estava o Estado
reconhecendo aquilo que muita gente no Brasil ainda se recusa a reconhecer, e a
ver o racismo nos diversos aspectos da vida brasileira.
Os negros são
uma força emergente. Antes, faziam sucesso só nas artes e no futebol, mas,
agora, eles estão se preparando para chegar nos postos de comando e sucesso em
todas as áreas. Como a sociedade brasileira vai reagir?
Ainda não vejo
essa ascensão dos negros como algo muito significativo. Há muito caminho pela
frente. Ainda há setores em que os negros são completamente excluídos.
Como o Brasil
supera isso?
Discutindo
abertamente o problema. Não vejo nos meios de comunicação brasileiros uma
discussão consistente e regular sobre essas questões.
Como superar a
desigualdade racial, mantendo o que de melhor temos?
O que de melhor
nós temos é a convivência amistosa superficial, mas, no momento em que o negro
aspira a uma posição de comando, a intolerância aparece.
Como o senhor
sentiu no carnaval tantas pessoas com a máscara do seu rosto?
Foi simpático,
mas, nas estruturas sociais brasileiras, isso não traz mudanças. Reforça certos
clichês.
Reforça? Por quê
Carnaval, samba,
futebol. Os brasileiros se sentem confortáveis em associar os negros a essas
atividades, mas há uma parcela, espero que pequena da sociedade, que não se
sente confortável com um negro em outras posições.
O senhor foi
discriminado no Itamaraty?
Discriminado eu
sempre fui em todos os trabalhos, do momento em que comecei a galgar escalões.
Nunca dei bola. Aprendi a conviver com isso e superar. O Itamaraty é uma das
instituições mais discriminatórias do Brasil.
O senhor não
passou no concurso?
Passei nas
provas escritas, fui eliminado numa entrevista, algo que existia para eliminar
indesejados. Sim, fui discriminado, mas me prestaram um favor. Todos os
diplomatas gostariam de estar na posição que eu estou. Todos.
Foto: Internet
Fonte: Globo.com
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